domingo, 29 de julho de 2012

Felinas

A luz do quarto não ajuda a se maquiar. O cuidado aos cílios é feito com um traço de luz da rua que entra pela  janela. Luz fria de poste: meio verde, meio azul, sem romantismo nem calor. Ótima para se maquiar.

As persianas de madeira captam o vento da rua. O velho rádio sintoniza a estação de jazz. Contrasta com o barulho da rua. Carros e motos se movimentando embaixo.

No prédio da frente o gato do vizinho equilibra-se no parapeito. A luz da TV de domingo tinge a parede de trás de sua morada, desenhando sua silhueta congelada, seu olhar felino.

Sentada à escrivaninha, fixa-se ao espelho com as costas eretas.  Os cabelos encerrados num coque inteligente aguarda pela sua vez na fila. Empina a bunda e a ponta do queixo como se esnobasse o mundo. Coxas redondas, afastadas; desnudas pela barra sovina do vestido. Revela na pele pequenos poros e pelos louros queimados pelo sol, microscópicos. Lindos.

A maquiagem nos olhos então a tornam felina. Ela também tem mais do que seis sentidos. Olha de novo seu reflexo ensaiado fazendo dois olhares diferentes. Não precisa ensaiar mais do que isso. Confirma mentalmente quem é de novo. Só para lembrar. Não posso esquecer.

O cigarro impresso com batom ganha uma cinza enorme durante o rímel. Um trago antes do próximo olho. Muda a estação com o cigarro entre os dedos. Mais jazz, mais um gole, mais um trago e um pouco de batom na borda do copo de vinho. Quem se importa com batom? Tenho um bastão inteiro para você aqui, babe...

Seu vestido pende no cabide. Dança de leve com o vento de chuva nas persianas. Vento quente de noite. Vai chover mais tarde. Pendurado no puxador da porta seu movimento hipnotiza o gato vizinho: lânguidas, felinas em noite de Lua cheia. Se ele chegasse até lá; pulava.

Limpa os dentes de batom com a ponta dos dedos. Apaga o cigarro no cinzeiro roubado do motel. Não foi ela quem o trouxe mas ficou pra ela. Ótima metáfora.  

De cima da cama sua gata a olha com indiferença. Óbvio. Ela é uma gata. Presta atenção na dona enchendo suas vasilhas de água e ração. Ela não se move. O que sobra da água vai para planta ao lado dos livros. Fecha então as janelas e a porta da varanda. Acaba com a alegria do gato curioso.

É hora de se despir. Tira seu vestido e blusa com o cuidado para não borrar a maquiagem. Calça os sapatos e passa perfume só no busto. Admira-se gostosa no espelho. Devolve o cabide vazio no puxador da porta da varanda. Amanhã eu guardo...

Acaricia o queixo da gata com a ponta dos dedos: deitada na cama com as patas enroladas sobre o corpo ela levanta a cabeça como se quisesse mais carinho. Não ganha. “Comporte-se menina”.

Abre a porta e sai. Dá duas voltas no trinco. Esconde a chave sob o capacho e desce pelas escadas do prédio. Seus saltos ecoam enquanto as luzes automáticas apagam nas suas costas.

Não sabe que horas vai voltar. "Ainda bem que dei comida para a gata".

terça-feira, 24 de julho de 2012

Good Morning

Sitting on the couch in the morning.
Ignoring the muted news on the TV
The scent of the shampoo over her wet hairs fights the scent of the fresh coffee recent made.

She smiles in her panties and shirts out of the corner of the mouth separating her things before to leave. She hums something. Some song that I just know will stick to my mind the whole fucking day. And he puts everything in his backpack.

And the morning light in the air vibrates with the frenzy of love that they just did. Coffee and sugar hydrates their morning rite. Morning glory... Good morning.

Coffee and orange juice with a few words. Communication that eliminates the text. Hopefully, the neighbors have listen to us, and the shower running water, waiting for the next bath. And fuck the water.

The dog greets the wall beside the couple on full lungs. Realize their happiness as bubbly newly opened soda can. And all the trembling muscles and tendons, eternally trying to photograph the previous minutes.

When they slept and woke up holding each other, aroused by the golden sun, making love with the windows open to get the fresh morning wind, with white curtains breathing.
Making love to start the day, just for luck. Good morning...

And the look of the cat stuck on top of the bedside table illustrates his latest trauma. He did not understand anything. (Or get it?)
So clean now with clothes and bathed he departs. A coffee flavored kiss. Holds her with his whole body. Now mint coffee kiss. A fluoride kiss.

Calls her gorgeous already feeling homesick. One more kiss on the mouth walking toward the door. She holds him, preventing him from leaving. "Stay with me a little more. ... Just a moment longer"

What a beautiful morning.
Lucky day, right foot.

Good morning